sexta-feira, 17 de julho de 2009

A carta. Parte II o Final.


Pode entrar.

Olá, Anne!

Olá, Ramon.

Enxugue-se com essa toalha e deixe os sapatos perto da porta. A areia molhada é péssima para o carpete!

Não vai me dar um abraço nem nada do tipo?

Vocês homens,... Parecem sofrer de amnésia.

Leu a carta?

Li sim...

O que achou?

Uma verdadeira barbaridade.

Não vai me dar uma chance?

Claro que não, tu se comportas como um garoto de 17 anos. Pelo visto não amadureceu nada. Como tens coragem de fazer algo do tipo e ainda com perguntas sem sentido como essas? Esqueceu que entre nós já não existe mais nada a partir do momento que tu escolheste a Amélia!
Mas eu não queria! Você mesma disse que eu poderia seguir esse caminho que não haveria nenhum problema. Eu, como um garoto qualquer, acreditei naquelas tuas palavras. Confesso que me deixaram abalado, mas com o tempo pude perceber o sentido real. Hoje eu não sou nada, passei esse tempo inteiro buscando algo que me completasse, mas não há nada além de você. Por isso estou aqui. Sei que parece ser tarde. Mas não é!

Não tenho palavras pra definir essa situação, ou tu és muito ingênuo, ou muito dissimulado! Se ainda fosse pra ter uma conversa social para tentarmos ser amigos ou simplesmente tentar apagar as desavenças, mas isso é demais! Olha só, eu já não sinto mais nada por ti, e nem milhões de palavras belas poderão resgatar algo. Minha parte na vida contigo foi bonita, porém eu já me desprendi a muito tempo desse amor juvenil e creio que você deveria fazer o mesmo.

É triste saber que nem tudo pode ser do jeito que esperamos, agradeço pela sua sinceridade. Dói muito perceber que a única pessoa que amo já não se importa mais com o amor. Acho que criei ilusões demais, fiquei preso a antigas situações e deixei de viver. Julgo ter enlouquecido caso contrário não estaria aqui e provavelmente faria tudo diferente, talvez como você realmente esperasse para criar docilmente essa paixão. Infeliz o dia em que me encontrei preso a situações totalmente distintas, infeliz sou eu, pois perdi a mulher que amo por besteiras familiares. A única coisa que me importaria nesse momento era o seu amor e não o tenho. Entrego-lhe essa carta, espero que leia. Adeus.

Ele desceu as escadas rapidamente, provavelmente estava chorando. Por um momento me vi disposta a aceitar novamente aquele homem, mas já não tinha forças para tanto. Sentei em uma poltrona e comecei a ler aquela carta.


Querida Anne,
Espero que tu compreendas que nada do que eu fiz foi para destruir o relacionamento que possuíamos. Sabia que você tornar-se-ia em uma mulher deveras solitária, com poucos amores e nenhuma paixão. Condeno-me por isso, sei que pode soar nada humilde da minha parte, mas é assim que me sinto longe de ti e creio que mesmo com o passar dos anos o amor que sentimos pelo outro ainda pode ser vivido. Tu provavelmente me julga infantil demais para ter você ao meu lado, mas saiba que eu te julgo ingênua demais para não perceber os fatos. Enquanto estávamos fazendo juras eternas para nós mesmos, a minha família e a de Amélia, planejavam concretizar essa união que não agradava nem a mim nem a ela. Porém sob ameaças de que esse ato não fosse concretizado, eles eliminariam todas as suas chances de sobrevivência, pois tu sabes muito bem do que meu pai era capaz para nos separar. Eu nunca toquei em Amélia, assim como ela nunca me desejou, dormíamos em camas separadas. As filhas que possuímos são somente dela, pois ela já estava grávida e foi um dos motivos do nosso casamento. E como tu sabes, meu pai dependia da influência política da família de Amélia, sabendo que eu possuía uma idade compatível com a da sua filha e tendo meu pai em suas mãos, o pai de Amélia logo iniciou os tramites do casamento. Sob pretexto de não perder o que havia alcançado, meu pai afirmou que se eu não me casasse com essa moça que eu mal conhecia ele mataria a você! Meu único amor! Como tu podes ver nem tudo acontece como esperamos, mas cabe a nós mesmos aceitar essa situação ou não, e apesar de parecer tarde demais, eu rogo aos quatro cantos do mundo que o seu amor renasça e una-se ao meu! Ramón

Nossa! O que eu faço agora Cartucha? A gatinha desceu as escadas indicando o caminho. Eu saí a procura dele pela cidade inteira, quando cheguei ao centro da cidade, havia fotógrafos por todas as partes em volta de alguém, perguntei a um indivíduo o que estava acontecendo:
“É a Amélia, filha do dono das carvoarias e empresas petrolíferas! Ela veio a cidade conversar com uma Anne”
Fiquei totalmente intrigada e confusa no momento, depois de tal declaração e afirmar que ambos não se amavam, será que ela sabia onde o marido estava? Cheguei perto para saber o que estava acontecendo e conversar com ela. Quando me observou puxou imediatamente o meu braço, como plano de fuga daquele local movimentado levou-me para o seu quarto no hotel.
Anne querida, sei que você pode ter muita ira com relação a mim e ao meu marido, mas quero que saiba que tudo foi armado.

Eu já sei de tudo!

Mas como assim?

Ramón contou-me tudo essa manhã, entregou-me duas cartas revelando o seu amor.

Ela estava atônita, puxou da bolsa uma carta.

Seria essa carta aqui?

Quando comecei a ler aquelas linhas, não podia entender eram as mesmas de anteriormente!Ela sentou-se no sofá puxando-me ao seu lado, segurando as minhas mãos, disse:
O Ramón morreu faz dois dias, estava com febre e delirando pelo seu nome. No seu testamento pedia para que eu lhe entregasse essa carta e infelizmente preso a sua família ele fez tudo para que você não morresse. Vim para essa cidade pois como pedido ele mandou entregar a ti essa carta e mais algumas coisas que estão em seu nome.

Eu não podia acreditar naquilo, que triste praga do destino! Como tudo pôde se tornar desse jeito. Desatei a chorar como uma criança boba e aquela criatura tentando me consolar de inúmeras formas.

sábado, 4 de julho de 2009

A carta. Parte I



Deitada na areia branca da praia observando as ondas do mar, em um dia nublado fora do comum, uma mão estende-se em minha direção segurando uma carta.
Mas o que é isso?-indaguei.
Era Carlos, um garoto pago para enviar recados, apesar de não ser comum ultimamente com a criação dos correios, ele sempre se oferecia a fazer esse tipo de serviço.
Mandaram entregar a você, Anne. O indivíduo pediu sigilo, afirmou que tu irás reconhecer ao ler as palavras. Tchau, Anne.
E saiu correndo, alguém esperava por ele ao longe, provavelmente o autor de toda aquela proeza. Mas como desvendar subitamente quem era?
Guardei aquela carta dentro de minha bolsa, quando chegasse em casa leria com atenção, naquele momento só estava disposta a desfrutar o vai-e-vem das ondas.
Aquele dia nublado não negava, passou alguns minutos e começou a chover, fui obrigada a sair dos meus pensamentos, mas nem por isso deixei me entregar as forças da natureza, levantei e segui o trajeto calmamente até a minha residência. As ruas haviam esvaziado como mágica, as gotas começaram a piorar. Passei a chave imediatamente na porta, a Cartucha , minha gata, encontrava-se estendida no sofá.
Dorminhoca - disse indo em direção a cozinha – Cartucha seguia-me prevendo os meus movimentos. Gatinha comilona! Entreguei a tua tigela de ração alisando suavemente a sua cabeça.
Acredita que hoje Carlos veio me entregar uma carta - ela olhou pra mim como se entendesse - não disse quem foi e provavelmente ele também não conhecia. Quem sabe, não é mesmo? Como será que adivinharei através da leitura quem escreveu essa carta? Bela tarefa me propuseram!
Fui para sala procurando por meu óculos de leitura, achando finalmente em cima de umas revistas. Comecei a ler :

“Dentre intensas primaveras nossos olhos foram completamente voltados ao nosso mundo. Mundo este repleto de magia e desejo. Cheio de sonhos, éramos jovens apaixonados. Sem receio dos perigos que nos cercavam, vivemos aquele intenso amor, mesmo não tomando o enredo esperado não consigo deixar de pensar em ti. Seu rosto, seu sorriso, me vem a mente em noites de angústia, dormindo ao lado de uma mulher que nunca almejei. Apenas um erro banal que cometi na vida por pressão que não podia suportar naquele momento. Você mesma disse que era para eu partir, e hoje estou eu desconsolado com tudo ao meu redor. Decepcionado com a vida que levo, com esse triste rumo do nosso amor. Nunca neguei o meu sentimento por ti, porém fui cruel conosco ao abdicar dele para seguir a vida que outros desejavam. Sei que depois de muito tempo, ambos seguimos nossas vidas, sei que você ainda mora na cidade em um lado onde possui poucas residências. Lembro-me que este era um dos seus desejos, ainda bem que um de nós está conseguindo as coisas que deseja. Pois tu sabes muito bem que meu único desejo era passar o resto dos dias contigo.”

Cartucha começou a andar entre as minhas pernas, peguei-a, coloquei no colo.
Está vendo no que essa brincadeira de viver me apronta. Depois de mais ou menos 10 anos surge com um “bilhetinho” desse. É pra chorar? Não, eu não irei!
Amassei o papel e o lancei em algum canto da sala, fui até a varanda respirar um pouco e observar a chuva. E lá estava ele, com ar de desespero.
Primeiro surge dizendo que se não o reconhecesse pela caligrafia e enredo era pra esquecê-lo, mas como? Ele sabia muito bem que era inevitável, mas fez questão de passar por uma de garoto esquecido. E agora encontrasse com ar de desesperado. Sinto pena, isso sim. – comentei com Cartucha. Era só o que me faltava! –completei.
Estava lá, parado, me olhando da varanda em plena chuva. Saí da varanda, desci as escadas, abri a porta.